Cores da vida: método mapeia a atividade do RNA dentro das células
(imagem - foto colorida dos mapas tridimensionais, como as cores, obtidos pelas fotografias que mostram o RNA sendo mapeado pelo novo método)
Um novo método permite aos cientistas obter fotografias instantâneas da expressão de milhares de genes em amostras de tecidos biológicos diversos. Assim, uma simples lâmina de microscópio pode ser utilizada na criação de mapas tridimensionais (como o visto na imagem de destaque acima) das maneiras como as células interagem umas com as outras, fatores de fundamental importância para a compreensão de doenças como o câncer (cancro).
Detalhada na Science em 27 de fevereiro, a técnica possui outras aplicações. Por exemplo, pesquisadores podem dotar células cerebrais de “códigos de barra” moleculares únicos, possibilitando o mapeamento das conexões cerebrais estabelecidas entre tais células.
Os especialistas em biologia molecular têm dificuldades de observar a configuração espacial da expressão gênica, processo através do qual um trecho de DNA é convertido em RNA que, por sua vez, pode ser traduzido em proteínas. Para realizar os estudos pertinentes à área, os cientistas normalmente empregam duas metodologias: a primeira consiste em triturar um pedaço de tecido e documentar todos os RNAs encontrados ali; a segunda, em aplicar marcadores fluorescentes para traçar a expressão de até 30 RNAs localizados dentro de cada célula de um tecido amostral.
Matrix
A nova técnica “fossiliza” o RNA na célula e o sequencia. Para que isto ocorra, a equipe de cientistas prende uma lâmina de tecido em uma superfície e retira as membranas celulares, mantendo intactos a estrutura da célula, o RNA e as proteínas. Em seguida, compostos químicos promovem a transcrição reversa de cada segmento de RNA, i.e., sintetizam fragmentos circulares de DNA de uma única cadeia molecular (ao contrário do famoso formato de dupla hélice da molécula) a partir destes segmentos de RNA.
Após a adição de outras substâncias, são formadas centenas de cópias de cada círculo de DNA que, quando se agrupam, recebem o nome de nanobolas (nanoballs), estruturas que também se unem quimicamente na formação de uma matriz transparente que se aproxima do exato desenho original da célula. Então, as nanobolas são analisadas pelo programa de sequenciamento SOLiD (Sequenciamento pela Ligação e Detecção de Oligonucleotídeos), método que emprega imagens digitais na captura das cores e localizações de marcadores fluorescentes inseridos no DNA.
Funciona como um endereço postal: se os correios quisessem identificar cada residência com uma cor fluorescente, rapidamente ficariam sem cores suficientes. O mesmo ocorreria com um fabricante que desejasse identificar cada um dos seus produtos com uma cor. O grande diferencial da inserção de marcadores fluorescentes na nova técnica é o de estes não aderirem a moléculas inteiras (o que geraria um enorme número de moléculas de mesma coloração), mas procurarem cada uma das quatro bases — A, T, C e G — do DNA. A sequência de cores é, então, interpretada pelo programa como um RNA específico, o que fornece aos pesquisadores um número praticamente ilimitado de combinações ou “códigos de barra”.
O estudo pioneiro de desenvolvimento da técnica foi realizado pelo biólogo molecular George Church, da Harvard Medical School, e seus colegas de Harvard e do Allen Institute for Brain Science. Os pesquisadores removeram uma camada de células de tecido conjuntivo (ou conectivo) cultivadas em laboratório e sequenciaram o RNA das células que se dirigiam ao ferimento no processo de reparação do tecido. Dos 6.880 genes sequenciados, 12 demonstraram alterações na sua expressão gênica. Por fim, oito dos genes identificados eram conhecidos por sua participação na migração das células, mas ainda não haviam sido estudados no âmbito da cura de ferimentos.
Robert Singer, biólogo da Albert Einstein College of Medicine, em Nova York, não esteve envolvido no trabalho, mas confirmou que a técnica analisa produtos da expressão gênica de forma muito veloz, opondo-a aos métodos convencionais que requerem a observação dos produtos “um por um”.
Je Hyuk Lee, colega de Church, indica que as aplicações do procedimento devem ir além da identificação de padrões de expressão. A tecnologia mais avançada que conhecemos para rotular e mapear neurônios, a Brainbow, se limita a 100 tonalidades simultâneas. Agora, é possível criar um trilhão (um bilião, em português europeu) de códigos de barra moleculares a partir de curtas cadeias de RNA, diz Lee, para quem a técnica lembra uma cena do filme “Matrix”, na qual o personagem Neo vê o código binário que gera todo o ambiente da Matrix.
A imagem de destaque utilizada neste artigo é propriedade da Harvard Medical School e do Wyss Institute of Biologically Inspired Engineering.
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